A DIFÍCIL ARTE DE PINGAR COLÍRIO NOS OLHOS

Recentemente, passei por cirurgias de cataratas, em ambos os olhos, uma vista de cada vez. Portanto, não foi à vista, foi a prazo.
O procedimento pré-operatório é um tanto demorado, mas a cirurgia, propriamente dita, é efetuada num piscar de olhos.
O pós-cirúrgico requer atenção especial, exigindo cuidados por cerca de quatro semanas. O processo não exige nenhum sacrifício para o paciente, até que é fácil seguir. Contudo, tem a parte mais difícil nesses cuidados, o uso de colírios por quatro semanas consecutivas, em horários pré-determinados.
Pingar o medicamento sem errar o alvo é uma tarefa para poucos, aplicar colírio nos olhos sem desperdiçar uma gota sequer é para os fortes. Você tem que ficar com um olho no gato e outro no peixe. Ergue a cabeça, abre um olho e fecha o outro, com cuidado pinga uma gota, com certeza cai fora.
Mais uma tentativa, fecha um olho e abre outro, erra o alvo. Você insiste, fecha um olho e não abre o outro, nada. Persistente, abre um olho e não fecha o outro. De novo, erra. Chega um momento no qual os dedos contraem cãibras. Com os olhos bem abertos, percebo que esvaziei o frasco e não consegui alcançar o meu objetivo.
Fecho os olhos e sinto uma inveja danada de Camões, ele escreveria com mais propriedade sobre a difícil arte de pingar colírio nos olhos.

Samuel De Leonardo (Tute)
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