O Senhor Baltazar, que um dia conheci, era um homem que nos dias de hoje seria um “marido de aluguel”. Morava num sobrado quase em ruínas, um imóvel deteriorado, nem tanto pelo tempo, mas principalmente, pelo desmazelo. Em cima, seu habitat onde vivia com a mulher, bem mais jovem, e dois filhos ainda crianças. Embaixo, fez da garagem a sua oficina, na fachada uma placa porcamente grafada: “Conssertos, reparos, manutensãos e instalassãos”.
Era um ambiente insalubre, apertado e desprovido de uma boa iluminação, ferramentas e bugigangas espalhadas por todos os cantos. Sobre a prateleira, um aparelho de rádio, modelo capelinha, incansável, emitia um som ensurdecedor e loucamente rouco sem trégua, o dia todo, todos dias.
Consertava motores, bicicletas, motos, calçados, guarda-chuvas. Cortava barba e cabelo, fazia jardinagem, reparos eletrônicos, elétricos, hidráulicos, pintura de paredes, jardinagem, costurava roupas, aplicava injeções e, pasmem, era um exímio benzedor.
Passou a vida consertando, remendando, ajeitando, enfim, ajustando defeitos e recuperando os mais diversos objetos. Mas perdera a alegria em realizar suas tarefas. Os seus últimos dias foram tristes e melancólicos para alguém tão versátil e engenhoso, capaz de fazer de tudo um pouco, descobrira que as duas crianças não eram resultados de sua produção, foram feitos por outros.
Desgostoso, cometera o suicídio. Deixou uma carta: “Na minha vida fiz de tudo, ou quase tudo, só não fiz as duas crianças. Não tem mais jeito de dar jeito. Agora, viver ou morrer, tanto faz.
Samuel De Leonardo (Tute)
samuel.leo@hotmail.com.br e Facebook @samueldeleonardo
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